Ulisses entrou porta adentro com cara de desespero. A noite havia sido um tanto conturbada. A nova namorada havia virado sua cabeça de vez. Uli se viu apontado por pensamentos sublimes de enlaces matrimoniais, filhos e uma bela casa e isso, definitivamente, não fazia parte de seus ideais de juventude. A posição nova lhe atacava o espírito de maneira confusa e arrebatadora.
Além disso, a nova posição obrigava uma retomada melhor em sua carreira, um novo salário, mais alto, angariar mesmo uma promoção. Seu salário de estagiário mal dava para o cinema de quarta, quanto menos para o sustento de uma família. Era algo a se pensar...
Os encontros foram reforçados pela vontade alienada de copular. Beijos, abraços, grandes passadas e nada de acontecer o drible final. A menina era meiga e pura, e guardava a grande tacada para as núpcias, sem dar abertura de furar o sinal.
Ulisses, pertubado, suado, cansado de insistir na acolhida viu como única alternativa consentir com o veredito e chamou todos à reunião famíliar. Enlaçados, os noivos bindaram a nova aliança e se fez algazarra geral. Uma festa foi marcada para o próximo maio, mês influente no calendário do ano e, com tudo perfeito, foi consumada as núpcias em um honesto lugar do Guarujá.
Ao voltar, Ulisses já satisfeito e feliz, voltou ao trabalho e conseguiu a tão sonhada promoção, graças ao seu esforço e sua nova posição social, de homem honesto, casado e futuro pai do primeiro filho.
E a primeira promoção se fez discreta e trouxe consigo uma casa modesta, roupas novas e uma mulher satisfeita e cheia de carinhos.
E a segunda promoção se fez modesta e trouxe consigo um carro, uma filha prendada e uma mulher gorduchinha e cheia de mimos.
E a terceira promoção se fez dispersa e trouxe consigo um carro para a esposa, a primeira viagem a negócios para NY no dia do nascimento do segundo filho, fins de semana no clube jogando tênis, uma nova casa, uma escola melhor para a filha, duas babás, uma esposa garbosa, cheia de unhas, massagens e cabeleireiros, com roupas de grife e cremes de estética.
E a quarta promoção se fez completa e trouxe consigo um carro importado, um Armani engomado, um contador picareta, uma viagem a Paris com a nova secretária gostosa, uma moto para a filha, uma viagem holandesa para o filho, uma esposa ciumenta, um carro batido, algumas doses de uísque, uns bons maços de cigarro, uma amante picante e um escritório com heliponto no alto do edifício.
E a quinta promoção se fez explosiva e trouxe consigo um rombo na conta, uma mulher neurótica, um filho drogado, uma filha grávida, um pedido de divórcio, outras doses e doses e doses de uísque, uns joguinhos com os amigos e uma internação no Albert Eistein com taquircadia crônica e uma suspeita de cancêr no pulmão.
E Ulisses, enfim, após quatro meses num quarto de hospital, começou a perder as promoções. E a falta de promoção trouxe consigo contas pendentes, a hipoteca da casa, a venda do carro importado, do helicóptero, o trabalho novo da filha, o esforço do filho, os carinhos e mimos da esposa traída, o retorno à casa modesta, às contas impressas, aos fins de semana de pizza, ao ônibus, à labuta do dia-a-dia e aos abraços e orações em família.
Mas o mais importante que Ulisses ganhou com a sua falta de promoção foi a certeza de que, como num coito interrompido, tudo às vezes é nada e nada, às vezes é tudo.
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